O crescente déficit da Previdência decorre da combinação de dois efeitos paralelos. De um lado, um crescimento extraordinário dos gastos com o pagamento de benefícios previdenciários, impulsionado por regras generosas para a concessão de novos benefícios e reajustamento dos valores do estoque de benefícios acumulados. De outro, a incapacidade da base exclusiva de financiamento desses gastos, as contribuições que incidem sobre a folha de pagamentos das empresas, para sustentar o equilíbrio das contas previdenciárias.
A estabilidade no fluxo das despesas contrasta com a alta sensibilidade da fonte de financiamento ao ciclo econômico, e esta é uma questão central que precisa ser discutida. A esse cenário pouco animador se somam outros fatores que aumentarão as dificuldades para sustentar o equilíbrio nas contas da Previdência, por meio de tributos incidentes sobre a folha de pagamentos do trabalho assalariado.
No novo mundo do emprego que surge com o avanço da economia digital, o mercado de trabalho passará por profundas transformações. A esse respeito, o relatório sobre o futuro do emprego, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em 2018, destaca que os humanos respondem atualmente por 71% das horas de trabalho nas empresas e 29% ficam a cargo das máquinas, mas, em 2022 as máquinas já deverão responder por mais da metade (57%) das horas trabalhadas, invertendo as posições atuais com respeito à participação de ambos no mercado de trabalho. É claro que essa relação varia expressivamente entre os diversos ramos de atividade, mas a média já denota a necessidade de dar a devida atenção a essa reviravolta.
Na esteira dessa mudança, a inserção no novo mercado de trabalho se desviará do padrão atual que divide os empregos em duas grandes categorias: formais e informais. O segundo grupo irá se expandir e isso não poderá mais ser visto como uma forma de emprego precário, podendo, inclusive, vir a ser aquele que irá abrigar os que ocupam posições melhor remuneradas no mundo da alta tecnologia.
A pesada carga tributária que incide sobre a folha de pagamento das empresas no Brasil irá acelerar esse processo, ampliando a erosão da base atual de financiamento do regime previdenciário e erigindo crescentes dificuldades para sustentar o pagamento dos benefícios da massa dos já aposentados.
O que precisa ser feito?
Adicionar à reforma das regras que visam à mudança no modelo de financiamento da Previdência, com a substituição da base de salários pela nova base tributária que se consolida com o avanço da economia digital.Essa nova base é objeto de crescente atenção no mundo, em decorrência da imaterialidade das transações e da erosão que as bases tributárias tradicionais vêm sofrendo, em decorrência dos novos modelos de organização dos negócios que surgem com a inovação tecnológica e a inédita escala da globalização. Nessa nova realidade, o registro das transações financeiras de todas as atividades que concorrem para a produção e o consumo de bens e serviços, bem como para a geração de renda na economia, torna-se uma fonte de informações mais segura e de mais fácil fiscalização para a cobrança de tributos. As transações financeiras surgem, portanto, como uma nova base tributária que tende a ganhar crescente importância na economia digital.
A adoção dessa nova base como fonte exclusiva de financiamento do regime previdenciário tem algumas vantagens que merecem ser devidamente apreciadas. Além da simplicidade operacional, que torna irrisórios os custos com obrigações acessórias, cabe destacar a enorme resiliência a mudanças no ambiente econômico, que se manifesta na forma de uma baixa sensibilidade da arrecadação a mudanças no comportamento da economia. A estabilidade na receita, proporcionada por esta característica, é um fato de extrema importância para torná-la uma fonte de financiamento dos benefícios previdenciários, que também apresentam essa característica, dispensando o recurso a medidas extraordinárias para sustentar o pagamento dos aposentados em momentos de recessão.