
Uma idosa de 90 anos foi resgatada no Grajaú, bairro da Zona Norte do Rio, no último dia 22, de situação análoga à escravidão por jornada exaustiva. Ela foi considerada a mulher com mais idade já encontrada nessa condição. A vítima trabalhava havia 50 anos para a mesma família, dos quais 16 foram como empregada doméstica na casa. Ela também cuidava da mãe da empregadora, que tem mais de 100 anos. Com a alegação de que tinha responsabilidade de cuidar da outra idosa, a mulher estava desde dezembro sem ver os parentes. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), ela vivia sem “desconexão do trabalho” e se sentia na “obrigação de servir” a família. A procuradora Guadalupe Torres, que atuou no resgate, disse que a vítima ficou feliz que iria reencontrar a irmã, mas demostrou preocupação com a idosa que cuidava.
— Foi uma relação de subserviência de anos, ela não saía da casa por ter preocupação em deixar a idosa sozinha. Quando ela foi resgatada, ela ficou feliz que veria os familiares, porém, ao mesmo tempo, ficou preocupada com a idosa que ela cuidava, questionando como ela ficaria — conta a procuradora.
Ela pontua que, embora exista essa relação de proximidade no âmbito doméstico, os direitos trabalhistas precisam estar presente. No caso dela, a fiscalização constatou que, além da jornada exaustiva, ela não tinha direito a folga ou a sair da casa.
— Ela ficava à disposição da outra idosa 24 horas por dia: dava banho, cuidava, limpava a casa, levava no banheiro, inclusive durante a madrugada. Por mais que ela pudesse dormir à noite, não tinha a desconexão do trabalho, ela sempre estava lá, atenta a um possível chamado da idosa. Não tinha como recompor as energias — diz a procuradora.
A procuradora conta que a vítima dormia em um sofá ao lado do quarto da idosa para poder ouvir qualquer chamado que fosse feito, já que as duas ficavam sozinhas na casa. A empregadora morava na rua de trás e ia ao local poucas horas por dia.
A equipe também constatou que a mulher não possuía o vínculo devidamente registrado e, portanto, não tinha nenhuma garantia previdenciária e trabalhista.
Enquanto esteve lá, a vítima recebia apenas um salário mínimo. Ela era paga em espécie e não recebia nenhum outro benefício. Durante os nove meses em que não saiu da casa, só conversou com a irmã por telefone. Uma vez ou outra, um sobrinho ia até lá buscar algum dinheiro.
Após o resgate, a família da empregadora pagou R$ 30 mil de salário e extras referentes aos últimos 16 anos de trabalho da idosa. O valor foi calculado pela Fiscalização do Trabalho. A equipe também emitiu a guia de seguro-desemprego especial e um valor de multa por dano moral individual.
Segundo o MPT, os empregadores vão responder por trabalho análogo ao escravo, falta de registro na carteira de trabalho e descumprimento de normas de saúde e segurança no trabalho.