O governador do Rio, Cláudio Castro, teve os sigilos telemático, fiscal e bancário quebrados nesta quarta-feira por autorização do ministro Raul Araújo, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Conforme informou a colunista Malu Gaspar, a medida foi solicitada pela Polícia Federal no inquérito que investiga desvio de recursos, pagamento de propina e fraude em licitação de contratos de projetos sociais do estado entre 2017 e 2020, nas gestões de Luiz Fernando Pezão e Wilson Witzel. Nesse âmbito, a PF deflagrou nesta quarta-feira a Operação Sétimo Mandamento, com buscas e apreensões que não atingiam Castro, mas que tinham como alvos três integrantes do atual governo, entre eles o irmão de criação do governador, Vinícius Sarciá Rocha.
Em abril deste ano, Raul Araújo já havia acolhido um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o chefe do Executivo fluminense fosse investigado por organização criminosa, fraude em licitações, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Os possíveis crimes teriam sido cometidos entre 2017 e 2018, quando Castro ainda era vereador no Rio em primeiro mandato, e prosseguido no período em que foi vice-governador (de 2019 a 2020).
O início das investigações
Na operação desta quarta-feira , a PF afirmou que se busca apurar irregularidades supostamente praticadas na execução dos projetos Novo Olhar, Rio Cidadão, Agente Social e Qualimóvel. No período abarcado pela investigação, diz a PF, uma organização criminosa “penetrou nos setores públicos assistenciais sociais” do estado, obtendo vantagens econômicas e políticas indevidas ao tentar direcionar a execução dos projetos sociais para seus redutos eleitorais. Além disso, foram identificados pagamentos de vantagens ilícitas entre 5% e 25% dos valores dos contratos na setor, que totalizam mais de R$ 70 milhões.
As ações foram um desdobramento da Operação Catarata, que desde 2019 apurava fraudes na Fundação Leão XIII, responsável por políticas de assistência social no Rio. No decorrer do processo, depoimentos do delator Marcus Vinícius de Azevedo, ex-assessor de Cláudio Castro na Câmara do Rio, relataram supostos repasses de propina ao político quando ele ocupou os cargos de vereador e de vice-governador.
Em nota, o governador, que sempre negou as acusações, afirma que a operação de ontem causa “estranheza e profunda indignação”, pois não traz “nenhum novo elemento à investigação que já transcorre desde 2019”. O texto diz ainda que “o fato de haver medidas cautelares, quatro anos depois, reforça o que o governador Cláudio Castro vem dizendo há anos, ou seja, que não há nada contra ele, nenhuma prova, e que tudo se resume a uma delação criminosa, de um réu confesso, a qual vem sendo contestada judicialmente”. Com relação às quebras de sigilo, o Palácio Guanabara diz que o “governador recebe com tranquilidade a decisão e afirma que todo homem público deve sempre estar à disposição do crivo das instituições”.
Quebra de sigilo e mandados
Além de Castro, outras seis pessoas tiveram os sigilos bancário e fiscal quebrados — incluindo Sarciá Rocha —, e cinco investigados tiveram o sigilo telemático derrubado. Já as buscas e apreensão tinham como alvo, junto como o irmão do governador, a subsecretária de Integração Sociogovernamental e de Projetos Especiais da Secretaria estadual de Governo, Astrid de Souza Brasil Nunes, e Allan Borges Nogueira, gestor de Governança Socioambiental da Cedae.
Na casa Sarciá Rocha, a polícia apreendeu ontem R$ 128 mil e US$ 7.535 em dinheiro vivo, anotações e planilhas com nomes, valores e porcentagens. Segundo a defesa dele, no entanto, o dinheiro está declarado na Receita Federal.
Atualmente, o irmão do governador é presidente do Conselho de Administração da Agência Estadual de Fomento, a Agerio. Em 2018, ele havia ajudado na campanha da chapa Wilson Witzel e Castro para o governo do Rio. E depois da eleição, foi nomeado como assessor de gabinete de Castro.
Allan Borges, por sua vez, atuava como presidente da Fundação Leão XIII entre janeiro de 2019 e maio de 2020, quando o órgão ficava sob a supervisão da vice-governadoria do estado, então comandada por Castro. Enquanto que Astrid de Souza Brasil Nunes foi nomeada ao atual cargo em maio deste ano, depois de já ter atuado como chefe de gabinete da Secretaria de Planejamento, no ano passado.
O que dizem os envolvidos
Ao RJ2, da TV Globo, a defesa do governador e de seu irmão disse que tenta obter uma cópia da decisão da Justiça para se inteirar dos motivos da busca e apreensão, uma vez que, segundo o advogado, os fatos noticiados remontam a anos atrás. Já em nota, o estado diz que Allan Borges não é réu no processo que resultou na Operação Sétimo Mandamento. E ressalta que Astrid de Souza Brasil Nunes repudia a ligação de seu nome a suspeitas de ilegalidade. “Ela afirma que sua carreira na administração pública é respaldada, há 42 anos, por uma atuação responsável, ética e transparente”, diz. Tanto Borges quanto Astrid afirmam estarem à disposição das autoridades para esclarecimentos necessários.
Marcus Vinícius de Azevedo era sócio da RioMix, uma das empresas investigadas no esquema de desvio de recursos em troca de propinas. Em um de seus depoimentos ao Ministério Público do Rio, no ano passado, ele afirmou que Castro recebeu US$ 20 mil em uma viagem à Flórida, nos Estados Unidos, quando ainda era vereador. Na época, Castro respondeu que havia no Rio uma “indústria de delações feitas por criminosos que querem se livrar da cadeia e acusam autoridades de forma leviana”.