No dia 24 de dezembro, 1.785 presos deixaram a cadeia para passar o natal com as suas famílias. Eles receberam uma autorização temporária da Justiça para deixar as unidades, por conta do benefício de visita periódica ao lar, também conhecido como “saidão” de Natal. Eles deveriam retornar ao sistema até o último dia 30, mas 253 deles não voltaram aos presídios. Entre eles, dois já foram chefes da maior facção de tráfico de drogas do Rio. O benefício, que permite a saída temporária, não é concedido para todos os presos e precisa respeitar algumas condições. Entenda como funciona.
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Primeiramente, apenas presos em regime semiaberto — que passam a noite no presídio, mas saem durante o dia para trabalhar — têm direito a este tipo de visita. Para isso é necessário ainda ter bom comportamento e ter cumprido ao menos um sexto da pena. As saídas costumam ocorrer em datas comemorativas em família, como Natal, Páscoa e Dias das Mães.
O advogado criminalista, professor e doutor em Criminologia e Direito Criminal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Reinaldo Santos de Almeida, pontua que a saída temporária é fundamental no processo de ressocialização dos presos e funciona como uma ferramenta de política criminal que visa a redução da reincidência:
— Os beneficiários são presos que cumprem regime semiaberto, com bom comportamento e que já tenham cumprido parte da pena. A Visita Periódica ao Lar (VPL) oferece ao preso a oportunidade de reconectar-se com o ambiente externo e fortalecer laços familiares e comunitários, elementos essenciais para a reintegração social efetiva. Ela funciona também como uma experiência para a capacidade do indivíduo de adaptar-se às normas sociais fora do ambiente prisional.
Ele explica que para decidir favoravelmente pelo benefício, a Justiça leva mais em consideração o comportamento do preso durante a execução da pena do que em sua vida pregressa:
— No entanto, aspectos como envolvimento em crimes organizados ou exercício de liderança em comunidades podem ser considerados pelo juiz ao avaliar o risco de fuga, ou de cometimento de novos crimes durante a saída. Essa avaliação é individualizada e depende da análise detalhada do caso concreto — afirma ele.
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Saulo Cristiano Oliveira Dias, o SL, um dos foragidos que evadiu do presídio após a concessão do benefício em 2023, teve o benefício negado no ano anterior. Na época, o Ministério Público foi contrário a permissão da saída temporária. No despacho, a juíza destacou que ele era reincidente, havia cometido crimes graves e não vinha “se dedicando aos estudos ou ao trabalho na unidade prisional no momento”.
No fim do despacho que negou o benefício, a magistrada ressalta que ele estava há pouco tempo no regime semiaberto e que “a própria progressão de regime, de per si, constitui um benefício ao apenado independentemente da concessão das saídas extramuros. Destarte, eventual concessão de saída extramuros, inicialmente, não se coaduna com o objetivo da pena, podendo servir, inclusive, de estímulo para eventual evasão”.
Nesta quarta-feira, dia 3, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) notificou a secretaria da Administração Penitenciária (Seap) para prestar esclarecimentos sobre os presos beneficiados com a Visita Periódica ao Lar (VPL) neste ano. O pedido de explicações foi feito pelo deputado Márcio Gualberto (PL), presidente da Comissão de Segurança Pública e Assuntos de Polícia.
Entre os questionamentos, o deputado pergunta para a secretária Maria Rosa Lo Duca Nebel, da Seap, quais foram os crimes imputados aos presos que tiveram o benefício e quantos já foram recapturados.
A alerj também quer saber quantos dos presos que tiveram direito à saída temporária usaram tornozeleira eletrônica e se outros chefes do tráfico deixaram de regressar aos presídios. Segundo o deputado, todas as respostas serão enviadas pela secretaria até a sexta-feira.
Na opinião de Gualberto, é preciso haver uma mudança na legislação para não permitir a saída de reincidentes.
— Presos perigosos e reincidentes não podem ser beneficiados com “saidinhas”, “visitas íntimas” e progressão de regime. Os presos devem ser tratados com dignidade, mas isso não pode significar transformar as cadeias em Motéis ou Colônias de Férias. Portanto, é necessário endurecer a Lei de Execução Penal — afirma ele.
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O advogado criminalista Reinaldo Santos de Almeida pontua que o uso de tornozeleiras durante essa saída não obedece uma regra específica, mas é uma opção disponível para os juízes, que podem determiná-las dependendo da circunstância de cada caso “sujeita a questões de disponibilidade orçamentária para aquisição dos equipamentos”.
Em nota, o Tribunal de Justiça do Rio informou que “não foi determinada a instalação de tornozeleiras eletrônicas nos apenados que tiveram o benefício da Visita Periódica ao Lar (VPL)”. Segundo o TJ, “em períodos curtos de sete dias, como o do Natal, e em outras datas especiais, como Dia das Mães, o Estado não possui estrutura nos presídios para instalação em tempo hábil dos equipamentos. Eles também reforçaram que a instalação das tornozeleiras ocorre fora dos presídios, inviabilizando o processo nesses períodos curtos de saída.