Algumas obras publicadas no século XIX tinham a capa tingida com um pigmento à base de arsênio, elemento tóxico para os humanos
Existem livros que podem matar os leitores? Sim, mas apenas algumas obras do século XIX, que tinham na encadernação o pigmento verde-paris, à base de arsênio, um metal muito tóxico para os humanos. A exposição prolongada a esse elemento pode ser até fatal.
Pensando no bem-estar e na segurança de leitores americanos, Melissa Tedone, chefe do laboratório de conservação da biblioteca, museu e jardim botânico Winterthur, no Delaware, nos EUA, lançou, em 2021, o chamado Projeto do Livro Venenoso, para localizar e catalogar as obras nocivas.
Segundo o site americano Oddity Central, a funcionária descobriu o problema da tintura com arsênio ao examinar um livro verde publicado em 1857. Ela estava consertando a lombada e a encadernação quando percebeu que o pigmento estava descascando, e achou isso estranho. As tintas das encadernações antigas costumam rachar e descascar com o tempo, o que não é nada anormal, a menos que o pigmento usado seja altamente tóxico.
Quando perturbado, o pó de pigmento verde-paris fica em suspensão no ar, podendo ser inalado. Parte também pode permanecer nas mãos de quem está manuseando uma dessas obras antigas. Claro que o risco à saúde aumenta com o maior contato com o arsênio.
Até 2022, a equipe da Winterthur descobriu mais de 150 livros venenosos do século XIX. Noventa deles são cobertos com tecido verde vivo e o restante tem o pigmento incorporado em etiquetas de papel ou elementos decorativos. Melissa Tedone já encontrou um livro que estava à venda em uma livraria local – e acabou adquirindo o exemplar, para tirar de circulação.
Como mostra a revista National Geographic, dependendo da quantidade de partículas de arsênio inaladas ou ingeridas, a pessoa pode se sentir letárgica e tonta, apresentar diarreia e cólicas estomacais. Na pele, o metal perigoso pode causar irritações e lesões. Casos graves de envenenamento por arsênio incluem insuficiência cardíaca, doenças pulmonares, disfunção neurológica e – em situações extremas – até a morte.
Mas o quão comuns são esses livros verdes venenosos? “É um pouco difícil de prever porque o nosso conjunto de dados ainda é pequeno, mas eu certamente esperaria que existissem milhares desses livros em todo o mundo. Qualquer biblioteca que colecione encadernações em tecido de meados do século XIX provavelmente terá pelo menos uma ou duas cópias”, revela Melissa à revista americana.
Cor mortal
A cor verde-paris ou verde de schweinfurt é produto da combinação de acetato de cobre com trióxido de arsênio, produzindo acetoarsenito de cobre. esse pigmento tóxico foi desenvolvido comercialmente em 1814 pela Wilhelm Dye and White Lead Company em Schweinfurt, na Alemanha, explica a National Geographic. Foi usado em vários produtos, de roupas e papel de parede a flores falsas e tintas. Na Inglaterra da Era Vitoriana, apenas em 1860, foram criadas mais de 700 toneladas desse pigmento mortal.
Curiosamente, a toxicidade do arsénio era conhecida nessa época, mas a sua cor vibrante, no entanto, era popular e barata. O problema é que as casas dos ingleses estavam cheias de papéis de parede liberando pó verde tóxico, que cobria até alimentos.
A pedido de Melissa Tedone, especialistas da Universidade do Delaware, nos EUA, analisaram a quantidade de arsênio presente na encadernação das obras do século XIX. Segundo a revista americana, eles descobriram que o tecido dos livros continha em média 1,42 mg do metal tóxico por cm². Sem cuidados médicos, uma dose letal de arsênio para um adulto é de aproximadamente 100 mg, o equivalente a alguns grãos de arroz.